Houve um tempo em que as orações humanas eram dirigidas à Deusa Mãe, como uma divindade de divindades que dominava um mundo de sociedades agrícolas.
Os diferentes cultos populares às Deusas tinham sido organizados através de um primordial e elementar: o poder de dar vida. Deste ponto de vista, a fertilidade da terra e a fertilidade feminina são uma e a mesma para as sociedades primitivas, dando respostas a perguntas existenciais sobre o mistério da criação.
“As culturas mais antigas da humanidade chegaram à conclusão de que a vida surgiu, perdeu-se e reapareceu em um ciclo incessante (como as estações do ano, as diferentes fases da lua, a morte e o nascimento as fizeram compreender…).
Elas entenderam que todos os elementos que compõem a natureza sem exceção (plantas, árvores, rochas, montanhas, água, vento, sol, lua, estrelas, mar…) eram seres vivos como os próprios seres humanos, já que todos esses elementos participavam igualmente do ciclo da vida, da morte e da regeneração. No âmbito deste pensamento animista, eles concluíram que a natureza como um todo era uma mulher/mãe que gerava vida e criaram a grande metáfora que tem marcado o pensamento dos seres humanos até hoje. Hoje está plenamente documentado que esta metáfora da natureza/mulher é evidente em toda a arte neolítica através de milhares e milhares de imagens”.
– Josu Naberan, “La Vuelta de Sugaar”. (O Retorno de Sugaar, em tradução livre, ainda não traduzido para o português.)
A Vênus de Willendorf representa a fertilidade e data do Período Neolítico. Esta representação da grande deusa mãe é uma das imagens associadas a estes antigos cultos, mas há muitas mais. Preparamos em nosso Facebook um álbum com imagens impressionantes desta religiosidade ancestral relacionada com o feminino.
A Grande Deusa ou A Deusa Mãe, chamada com infinitos nomes locais – mas todos referentes à divindade feminina que criou tudo – estava presente quase que exclusivamente na mente mitológica dos seres humanos de 30.000 a 3000 a.C. Alguns desses nomes são:
Na América pré-colombiana: A Pachamama Andina; Mapu para os Mapuche; Ixchel para os Maias; Coatlicue para os Astecas.
Na África: a deusa Mawu, Ísis no Egito, cujo culto se espalhou pelo mundo greco-romano.
Na Ásia: Ninursague na Suméria. Arina para os Hititas. Hepat na Babilônia. Isthar na Mesopotâmia. Shakti, a energia feminina deificada do budismo.
Na Europa: Reia na Creta. Kubaba, na Turquia. Cibele na Grécia…
Na Mesopotâmia, a sexualidade era um ato religioso. No berço das civilizações pensava-se que se a vagina era a “porta de saída” neste mundo, era também a porta de volta ao infinito e através do ato sexual, tanto homens como mulheres alcançariam a transcendência e criariam pontes com a Deusa.
A deusa Isthar, uma das deusas mais importantes para o povo sumério, representava o sexo, a fertilidade e o amor. Seu culto poderia ter envolvido rituais sexuais nos templos erguidos em sua homenagem.
Em um processo que levou milhares de anos, as culturas pagãs e politeístas começaram a dar mais importância aos deuses guerreiros e masculinos que removeram a Grande Deusa.
O judaísmo é a primeira religião monoteísta que atribui a Javé a capacidade generativa da Deusa (criar e dar vida) sendo este o primeiro Deus que subtrai o poder feminino para depositá-lo no outro lado.
As religiões monoteístas colocam o poder em uma única entidade todo-poderosa e onipresente. Dar a este único deus uma forma andrógina era indispensável para reforçar a supremacia do homem sobre a mulher.
Conceber religiões monoteístas com um único deus masculino, serviu às novas civilizações para justificar o direito à autoridade masculina absoluta sobre as mulheres e o resto dos seres vivos do planeta… assim “na terra como no céu”… para governar o mundo.
Este processo de masculinização dos deuses, foi um processo longo e difícil, em uma época em que os poderes religiosos exerciam o poder moral, político e judicial das sociedades. Este longo processo, no qual o poder da deusa deixou de manter o equilíbrio entre o masculino e o feminino, foi o momento em que o imaginário coletivo tirou o poder e as possibilidades das mulheres.
Sobre a mitologia ancestral, sobre as deusas mãe e os estudos feministas que estão sendo realizados em torno dela, quero dedicar alguns posts neste blog.
Como material complementar a este post, preparamos um álbum no Facebook com imagens de representações da Deusa ao longo da história, que expandiremos gradualmente com novas contribuições.
E esta playlist com músicas de mulheres do século XXI que nos aproximam do poder mítico feminino. Acorde a deusa em você!
Escola de Atenas
Laura Fresneda Moreno, escreveu e publicou este artigo no site “Escuela de Ateneas”. Foi traduzido do espanhol por mim e publicado aqui com a autorização expressa da autora.